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JBO - Jornal Brasileiro de Oftalmologia              12                Nº 200 - Janeiro / Fevereiro / Março - 2023





                                      Oftalmologia e Doenças Raras




      Dia 29/2, pela raridade da data, foi escolhido para ser   a identificação da causa pode trazer muitos benefí-
      o Dia Internacional das Doenças Raras, comemorado        cios aos pacientes e suas famílias, a saber: 1) Permi-
      nos anos não-bissextos no dia 28/2. Com o avanço         te um ganho na compreensão daquela condição por
      do conhecimento e das técnicas de investigação em        comparação com outros casos que tenham a mesma
      genética, um diagnóstico aprofundado de uma con-         causa e já tenham sido relatados na literatura médi-
      dição ou uma predisposição genética se tornou pos-       ca; 2) A compreensão oriunda do diagnóstico exato
      sível.  Na Medicina de precisão genética que passare-    permite oferecer ao paciente e seus familiares uma
      mos a praticar, isto se torna ainda mais importante no   informação prognóstica mais precisa, definir uma pro-
      diagnóstico etiológico de Doenças Raras.                 gramação de monitoramento periódico visando a an-
                                                               tecipação de complicações mais frequentes naquela
      Doenças Raras (DRs) são as que afetam em geral me-       determinada condição; 3) Permite praticar uma Medi-
      nos do que uma em cada duas mil pessoas. Acome-          cina preventiva através do Aconselhamento Genéti-
      tem cerca de 7% da população, o equivalente a 14         co, incluindo estimativas de risco de repetição, diag-
      milhões de brasileiros. O número total de diferentes     nóstico genético embrionário, pré-natal ou neonatal,
      DRs excede 8 mil, 80% delas de causa genética. To-       assim como a oferta de testes para identificar familia-
      das compartilham vários aspectos; 1) 75% se manifes-
      tam ainda na infância; 2) A regra é a dificuldade de     res em risco de terem a mesma alteração genética; 4)
      diagnóstico; 3) Não têm cura e poucas tem tratamen-      Elimina a necessidade de procedimentos invasivos e
      to específico, então os cuidados visam a melhoria da     custos de investigação de outros possíveis diagnósti-
      qualidade e expectativa de vida; 4) São geralmente       cos similares; 5) Permite o acesso a terapias precisas,
      crônicas, progressivas, e potencialmente fatais; 5)      como aquelas dependentes de mutações específicas.
      Não são prioridade da indústria farmacêutica, que        O exemplo, mais prático (apenas o primeiro de uma
      prefere desenvolver medicamentos para tratar mais        série que virão nos próximos anos), é a possibilidade
      pessoas; quando há interesse, alguns medicamentos        de oferecer terapia gênica para certos pacientes com
      são muito caros; 8) Poucos profissionais são especia-    retinose pigmentar causada por mutações no gene
      lizados em DRs; 9) As dificuldades de acesso a cuida-    RPE65; 6) Mesmo quando o diagnóstico definitivo for
      dos é regra mesmo para quem tem Plano de Saúde,          o de uma condição que ainda não tenha um trata-
      visto os obstáculos nas contratualizações e cobertu-     mento específico, este será útil para que o paciente
      ras; 10) Sofrem com a insensibilidade das agências de    seja direcionado a grupos de pesquisas clínicas (caso
      regulamentação às peculiaridades das DR.                 queira e quando estes estiverem disponíveis) e ajudar
                                                               em novas descobertas terapêuticas.
      As  DRs  que  afetam  a  visão  só  tiveram  um  grande
      avanço no conhecimento genético nos últimos anos,        Ao Oftalmologista está lançado o desafio de se adap-
      e isto se deveu ao fato delas serem numerosas (mais      tar a esta nova realidade, passando a investigar as
      de 900), geneticamente heterogêneas (ou seja, a re-      causas mais profundamente e rotineiramente. Neste
      gra é que sejam causadas por alteração em um entre       dia das Doenças Raras, Genética e Oftalmologia fi-
      muito genes) e ao desenvolvimento de novas tecno-        nalmente se encontram para propiciar diagnósticos e
      logias de análise genética que tornaram possível ana-    tratamentos mais precisos, permitindo aos pacientes
      lisar rotineiramente milhares de genes em um único       ter uma vida mais longa e com muito mais qualidade.
      exame de sangue. Estes fatos transformaram o co-
      nhecimento genético em algo aplicável no dia a dia
      do Oftalmologista. As indicações se multiplicaram ra-
      pidamente, e vão desde a identificação de causas de                             Dr. Salmo Raskin
                                                                                      Médico especialista em
      doenças retinianas hereditárias, distrofias da mácula,                          Pediatria e Genética,
      casos  de  glaucoma  e  catarata  de  origem  genética,                         Presidente do Departamento
      ceratocone,  até  a  causa  de  tumores  oculares  como                         Científico de Genética e do
                                                                                      Grupo de Trabalho em Doenças
      o Retinoblastoma, entre outros. Tenha o paciente                                Raras da Sociedade Brasileira
      um quadro sindrômico com manifestação oftalmo-                                  de Pediatria, e Diretor do
                                                                                      Laboratório Genetika, em
      lógica, ou isolado afetando exclusivamente a visão,                             Curitiba, Paraná.
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