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Flávio Rezende Dias (1936-2020)
Fotos do álbum de família
Dr Flavio Rezende Dias, formado pela
Faculdade Nacional de Medicina (UFRJ) em
1964, casado com Eliane Placco Attanasio
de Rezende de 1971 a 2020 (49 anos). Teve Flávio Rezende
como fi lhos: Flavio Attanásio de Rezende com Edna
Filho, Renata Attanásio de Rezende Bisol e Almodin, que foi
Thiago Bisol (Genro). Seus netos: Philippe sua residente do
Boulanger Rezende e netas Carina, Betina, Hospital Souza
Beatriz Rezende Bisol. Aguiar: amizade de
Foi chefe do Serviço de Oftalmologia do uma vida
Hospital Municipal Souza Aguiar, chefe do
Serviço de Oftalmologia do Hospital São
Vicente de Paula, professor benemérito do
Departamento de Medicina da PUC-Rio,
tendo coordenado a especialização de Oftal-
mologia de 1992 a 2018. Foi presidente da
Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO), Flávio Rezende, Dona Eliane, os fi lhos Renata Rezende e Flavinho,
Sociedade Brasileira de Catarata e Implantes com o genro Tiago Bisol, e os netos: Philippe, Carina, Betina e
Intraoculares (SBCII), Sociedade Brasileira Beatriz
de Administração em Oftalmologia (SBAO).
Foi um dos sócios dos Oculistas Associados, tinha paciência de fazer uma longa lista co- oftalmologistas, seguindo os passos do pai, porto seguro que sempre estava a nos esperar
por 42 anos (1965 a 2007). locando as pinças, bisturis e outros materiais, vem obtendo luz própria nos mostrando que nas horas de dúvidas.
Como presidente da SBO, revolucionou recolhendo dinheiro de cada um e nunca dei- realmente boa árvore sempre dá bons frutos. Na fi nitude da vida, veio como uma bri-
a sociedade, implantando a informatização e xava ninguém na mão. Muitos anos depois, Eliane, sua companheira de luta e o sa suave que passou por nós e deixou marcas
melhorando a estrutura da sede. . Participou de quando nós começamos a fazer este tipo de equilíbrio fi nanceiro e emocional da família, indeléveis na nossa formação ético, moral
infi nitas lutas políticas da oftalmologia política. viagem conseguimos entender, quanto tempo nunca fugiu à luta. Esteve com ele ao longo e profi ssional. Obrigado, Dr. Flavio. O Sr
Dr. Flavio no meio médico formou grande e paciência ele nos dedicava. Mesmo após a da vida, nos bons e difíceis momentos. Elia- cumpriu com grande efi ciência sua existên-
número de residentes que hoje trabalham em Residência nunca nos abandonou, visitava ne mostrou sua força nos últimos dois anos, cia. A nós, cabe pedir a Deus que lhe receba
todo o país e alguns no exterior. Teve atuação com frequência as clinicas de ex -alunos e quando às vezes a vida lhe exigia mais, do com carinho e o acalente em seus braços.
marcante nestes residentes pela sua conduta sempre ajudando aqueles que se dispunham que outras de nós podia suportar. As brumas do tempo tudo apaga, mas
ético-moral inabalável, além de sua grande a organizar ou fazer qualquer evento.. Dr. Flavio, nasceu em Guaçuí (Espírito em nós o Senhor sempre será lembrado
disposição em ensinar as melhores técnica Fora do meio médico era somente Flavio. Santo) em 17/06/1936. Faleceu aos 83 anos, como o grande mestre que tivemos a honra
oftalmológicas. Quando viajar para um con- Frequentava o Club Paissandú, onde mante- já vinha sofrendo de uma doença neurológica e privilégio de tê-lo.
gresso no exterior era para poucos, lá estava ve ao longo de sua vida um grupo de amigos degenerativa em estágio avançado. Apesar Descanse em paz e em Deus.
o Dr. Flavio se dispondo a trazer material de confrarias. Como pai e avô cumpriu de todos sabermos que sua partida era ine- Edna Almodin
cirúrgico para seus residentes. Incrível como com esmero sua função. Os fi lhos, também vitável, sentimos como se perdêssemos um Presidente da SBO
Sempre impecável, de branco, Flávio Rezende Tanta coisa que
transmitia confi ança e alegria a pacientes e residentes gostaria de ter
falado para ele....
Desde muito pequena, de minhas recorda- no rosto. Tinha um prazer de ensinar que Meu paizão nunca foi de nos elogiar...mas,
ções mais remotas, lembro da fi gura elegante e era nato, transbordava seus conhecimentos e para nossa surpresa, nos escolheu para fazer
forte usando, diariamente, impecável unifor- aprendizados ora provenientes dos congressos suas cirurgias oculares. Tanto eu quanto meu Aprendi com o meu Pai, Dr Flavio
me branco brilhante que me envolvia na arte nacionais e internacionais, ou ainda o que irmão jamais poderíamos imaginar tamanha Rezende Dias, a ser meio desconectado
da Medicina e que, desde tão cedo, passei a aprendia no trato com seus pacientes, a quem confi ança, mas, ao mesmo tempo, não conse- das emoções, mesmo de pessoas muito
exercer ao brincar com minhas bonequinhas. tanto se dedicava. Era bem comum não ter guimos recusar tal homenagem. Eu e o Tiago queridas. Não, não éramos insensíveis,
Ele saía cedo e voltava tarde, dava plantões algum colega oftalmologista assistindo-o (meu marido) fi zemos sua catarata e Flavinho apenas “durões”. Terrível para Dona
algumas noites e aos domingos, enquanto em operar. Durante e após cada cirurgia, com- e Monica Kickinger (a quem estimava como Eliane, minha mãe, mas é como se isso
casa ,estava sempre estudando. Eu e meu irmão partilhava os parâmetros, os conhecimentos, uma fi lha) sua vitrectomia via pars plana por nos mantivesse conectados, eu e ele,
Flavinho, desde muito novos, acompanhávamos e, acreditem, até aqueles “macetes” mais hemorragia vítrea pós descolamento de vítreo no nosso mundo um pouco distante.
as horas em que se envolvia nas edições de vídeos “secretos”. Assim como era bem comum com rotura retiniana. Compartilhava minhas difi culdades e
de cirurgias intraoculares que, na época, exigiam que, durante a semana ou fi nais de semana, Pouco antes de completar 80 anos, reali- sentimentos com meus amigos, mas
um verdadeiro arsenal de aparelhos. Logo que a qualquer hora, algum ex-residente ligasse zava sua última cirurgia de facoemulsifi cação nunca em casa. Após sua partida que
atingimos idade sufi ciente, começamos a aju- para pedir uma opinião ou discutir um caso. ainda com uma mão delicada (apesar da luva percebi o quanto guardei dentro de
dá-lo a confeccionar seus slides para dezenas Em qualquer intervalo, entre cirurgias ou 8,5) e fi rme, mas decidimos que estava na hora mim. Nunca tinha chorado tanto...
de aulas que ministrava por todo Brasil. Nesta consultas, principalmente na hora do cafezinho, de parar de operar, pois apesar da mão ainda E como se perder a maior referên-
época, fazer uma apresentação de slides era bem disputávamos sua presença, pois sempre apren- segura... neste momento começou seu desen- cia da sua vida não fosse sufi ciente, a
artesanal, fazíamos os slides no computador, díamos alguma novidade ou ouvíamos mais um canto pela vida, impossível imaginar parar de
fotografávamos cada slide com máquina ana- caso interessante de um interminável repertó- operar... pela primeira vez o vi desanimado. pandemia ainda me colocou isolado
lógica sobre um tripé, ajustando diafragma e rio. Vivemos juntos momentos inesquecíveis, Continuou atendendo pacientes com meu no Canadá, sem poder me despedir e
foco, mandávamos revelar, rezando para saírem nossas primeiras cirurgias, seu perfeccionismo auxílio até 81 anos quando se aposentou. De desabafar tudo aquilo que guardava
em foco, cortávamos e os montávamos em mol- cirúrgico, a extrema habilidade em confeccionar lá para cá, sua doença neurodegenerativa evo- dentro de mim por décadas. Não me
duras. Recebíamos nossos honorários por aula uma incisão, rexe, sutura com “slip not”, minha luiu, pois, privado de exercer a Oftalmologia, lembro nem de ter falado: “Te amo
montada e esta era nossa mesada. Meu paizão primeira fi xação de lente intraocular, dezenas de sua missão e prazer pela vida foi se apagando. Paizão”...
nunca foi de nos dar muita “moleza”. Dizia que congressos que compartilhamos. Apesar disso, até nosso último encontro abria Agora que percebi o real impacto
“dinheiro vem do trabalho”. Nossa relação com Era o maior otimista que conheci, não me seu sorriso largo quando nos via. que ele teve sobre colegas e amigos
ele se estreitou mais quando entramos na Re- lembro de vê-lo reclamar, de queixar-se de A tristeza de pensar que não teremos mais em todas as partes do país, me recuso
sidência em Oftalmologia, eu em 1999, e meu cansaço ou estresse, nunca deixou de trabalhar seu sorriso por perto, seu conselho, seu apoio, a deixar sua ausência física sem uma
irmão dois anos antes, foi aí que conheci mesmo por qualquer que fosse o motivo. Minha mãe sua ajuda, não é privilégio apenas meu e do continuidade.
meu paizão. Fiquei encantada ao perceber como Eliane, sempre na retaguarda, se certifi cava Flavinho, mas também do Tiago (genro) e de Criarei uma fundação de ensino
sua fi gura era importante, não apenas para mim de que a estrutura estaria de pé e que ele po- tantos outros fi lhos adotivos oftalmológicos em seu nome e darei sequência a seu
e meu irmão, mas, também, para seus residentes deria continuar mergulhando em seu maior que se manifestaram com tanto carinho após legado. Não tenho ideia de como será,
e pacientes. “hobby”, no que lhe trazia maior satisfação e seu falecimento assim como amigos, colegas mas tenho certeza que contarei com a
Com relação aos pacientes, ele entendia mais alegria...a Oftalmologia. e colaboradores. ajuda de muitos para perpetuar seu
que nossa postura positiva era fundamental A firmeza e rigidez do Dr. Flávio se Apesar de estar com coração apertado, sorriso no conhecimento e na alma de
no tratamento. “Vamos fazer de tudo para afrouxou quando virou avô do Philippe (fi lho saudoso, sofrido,estou certa de que continuará inúmeros oftalmologistas brasileiros.
resolver o problema do paciente Rê!” Nunca do Flavinho), Carina, Betina e fi nalmente em todos nós como exemplo de caráter, como Está lançado o próximo desafi o
teve muita “frescura”, não era de passar a mão Beatriz (minhas fi lhas) e, então, passou a ser mentor e exímio cirurgião. Paizão. Vamos com tudo!
na cabeça e fi car de dengo nem conosco, os carinhosamente chamado de “Vovô Paizão”. Por seu amor, por tudo que nos ensinou,
fi lhos, nem com os alunos. Era durão quando Ele brincava com as crianças, as carregava no pelo caminho do bem que nos conduziu, nosso Obrigado demais Paizão.
necessário, puxava as orelhas, mas, ao mesmo colo, dançava e cantava, se realizou também reconhecimento e gratidão. Obrigada Paizão. Flávio Attanasio de Rezende
tempo, estava sempre com aquele sorriso largo como avô. Renata Attanasio de Rezende Bisol