Page 7 - JBO-188-189 (JAN-FEV-MAR-ABR-MAI-JUN)
P. 7
7
Janeiro/Fevereiro/Março/Abril/Maio/Junho - 2020
No Brasil, mulheres se
destacam nas pesquisas sobre
a pandemia do coronavírus
Eleonora Monteiro em maio, está a infectologista carioca Sue Ann Costa
Clemens, (diretora do Instituto para a Saúde Global da
O ano de 2020 certamente vai fi car na História como Universidade de Siena-Itália), convidada a contatar a
aquele em que a humanidade viveu uma pandemia de Unifesp para montar o principal centro de estudo.
dimensões alarmantes -a do coronavírus, só comparada Muito antes do início de um acordo para a produção
recentemente com a da gripe espanhola de 1917. No da vacina Oxford no Brasil, a socióloga Nísia Trindade
início do ano, ninguém pensava que a humanidade Lima, primeira mulher a presidir a Fiocruz em 120 anos,
seria atingida por um fl agelo que nos remete aos piores já coordenava ações que fi caram sob a responsabilidade
períodos da História, como o da peste na Idade Média, de instituição, como a produção de milhões de testes
e o JBO se preparava para fazer a sua tradicional matéria diagnósticos, a capacitação de laboratórios públicos do
pelo Dia Internacional da Mulher (8 de março). país e de países vizinhos e a preparação do seu Instituto
Os acontecimentos forçaram uma mudança da pauta, de Infectologia para atender pacientes com a doença.
focando principalmente no papel das mulheres como Os três centros de estudo da vacina no Brasil: em São
cientistas, pesquisadoras, à frente dos estudos sobre o Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, têm à frente dos trabalhos
coronavírus e o o SARS-COV-2. Não são só mulheres, cientistas mulheres, assim como o braço brasileiro do
é claro, que participam das pesquisas, mas a presença laboratório farmacêutico AstraZeneca, que fez parceria
feminina cresceu signifi cativamente nos últimos anos, com a Fiocruz para transferir a tecnologia do produto.
motivos de comemoração numa área até há pouco Diretora médica da AstraZeneca, Maria Augusta
predominantemente masculina, razão pela qual o JBO Bernardini, mãe de dois fi lhos, de 3 e 7 anos, coordena
celebra essa mudança de paradigma. uma equipe de cerca de 25 pessoas que trabalham em
Desde 2009 o número de mulheres que cursam diversas frentes. Lidando diariamente com outras mu-
Medicina no país é maior do que o de homens. E as lheres à frente do processo, ela defende maior valorização
mulheres já são maioria entre os profi ssionais com menos feminina. Para ela, desigualdades históricas são combati-
de 29 anos de idade., das não só com oportunidades, mas com exemplos. No
Segundo a Organização dos Estados Ibero-america- seu caso, Maria Augusta ressalta que ao fazer o processo
nos (OEI), o Brasil é o país com maior percentagem de seletivo para a AstraZeneca e ser chamada havia decidido
artigos científi cos assinados por mulheres na América que não trocaria de emprego na ocasião porque estava
Latina e na comunidade ibero-americana. Entre 2014 e tentando engravidar. “Cheguei a falar isso para o RH da
2017, o Brasil publicou cerca de 53,3 mil artigos, dos empresa e eles me disseram que isso de forma alguma
quais 72% são assinados por pesquisadoras mulher. Atrás seria um impeditivo”.
do Brasil aparecem Argentina, Guatemala e Portugal Membro da Academia Nacional de Medicina e da
com participação em 67%, 66% e 64% dos artigos Academia Brasileira de Ciências, autora de mais de 300
publicados, respectivamente. No extremo oposto estão estudos, chefe do Laboratório de Investigação Pulmonar
Chile, El Salvador e Nicarágua, com mulheres partici- da UFRJ, a médica Patrícia Rocco lidera um grupo que
pando em menos de 48% dos artigos publicados. Além investiga o uso de derivados de células-tronco contra
desses países, a OEI analisou a produção científi ca do o novo coronavírus em pacientes em estágio avançado
México, Espanha, Uruguai, Bolívia, Colômbia, Costa da doença.
Rica, Cuba, República Dominicana, Equador, Hondu- Natalia Pasternak, microbiologista, presidente do
ras, Panamá, Paraguai, Peru e Venezuela Instituto Questão de Ciência e pesquisadora do ICB-
O interesse das mulheres pela Medicina e pela -USP, Margareth Dalcomo, cientista e pneumologista
Ciência vem crescendo a cada ano e acredita-se que a da escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, entre
pandemia irá acelerar esse processo também nas áreas tantas outras, destacam-se na divulgação da importância Fiocruz, fundada
afi ns. No Brasil, brasileiras já se destacam à frente da do conhecimento científi co para combater a pandemia por Oswaldo Cruz,
busca da vacina contra o coronavírus. Por trás da parce- Todas são unânimes: a participação brasileira faci- que liderou a vacina
ria que trouxe ao Brasil os testes da vacina de Oxford, litará nosso acesso à vacina, benefi ciando a população.
obrigatória contra a
Fotos de divulgação varíola no início do
século XX, hoje faz a
A tradicional
Universidade prospecção de todas
de Oxford, na as vacinas existentes
Inglaterra,lidera que estão sendo
um dos estudos testadas contra o
da vacina contra coronavírus
o COVID-19. A
infectologista carioca
Sue Ann Costa
Clemens montou o
primeiro centro de
estudo na Unifesp,
atendendo convite
de Andrew Pollard,
investigador chefe da
instituição
No Laboratório de
Investigação Pulmonar
da UFRJ, na Ilha do
Fundão, a médica
Patrícia Rocco lidera um
grupo que trabalha para
desenvolver terapia com
células-tronco contra o
novo coronavírus
Unifesp, parceira da Universidade de Oxford na busca de uma vacina, foi
autorizada pela Anvisa a continuar os testes depois de uma pausa devido a
problemas apresentados por uma voluntária